quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

* Três lições que não podem ser esquecidas das eleições 2010.

Primeira lição: a eficiência da menção de candidatos e partidos

É costume que, em período eleitoral, os Bispos orientem os fiéis a votar em candidatos honestos, tementes a Deus, defensores da vida e da família, contrários ao aborto, ao homossexualismo e à prostituição.

Essa orientação genérica tem eficácia reduzida. Limita-se a enunciar uma premissa maior (“vote em candidatos com tais qualidades”), deixando aos eleitores a incumbência de formular a premissa menor (“este candidato tem / não tem tais qualidades”) e a conclusão (“posso / não posso votar neste candidato”).

Seria ilusório esperar que os 135.804.433 eleitores brasileiros fossem capazes de verificar, por si mesmos, que candidatos preenchem esses requisitos. E isso pelos seguintes motivos:

Primeiro, grande parte dos eleitores tem pouca instrução.

Segundo, mesmo os eleitores mais instruídos nem sempre têm tempo de fazer uma pesquisa detalhada e segura sobre cada candidato.

Por fim, assim como “de noite, todos os gatos são pardos”, em época eleitoral todos os candidatos se apresentam como defensores da vida e contrários ao aborto, se verificam que isso pode atrair votos.

O que fez a diferença entre as eleições 2010 e as dos anos anteriores é que um grupo de Bispos ousou adentrar na premissa menor. Refiro-me à Presidência e à Comissão Representativa dos Bispos do Regional Sul 1 da CNBB, que em 26 de agosto de 2010 aprovaram o documento intitulado “Apelo a todos os brasileiros e brasileiras, recomendando a sua “ampla difusão”.

O texto do “Apelo” continha a premissa maior: “Recomendamos encarecidamente a todos os cidadãos e cidadãs brasileiros e brasileiras [...] que, nas próximas eleições, dêem seu voto somente a candidatos ou candidatas e partidos contrários à descriminalização do aborto”.

Mas, ao contrário do habitual, o texto trazia também vários fatos importantes relativos à premissa menor: o Partido dos Trabalhadores é favorável à descriminalização do aborto.

Assim, os leitores do “Apelo” ficaram conscientes de que não poderiam votar em candidatos do PT sem traírem suas promessas batismais. Como esse documento começou a ser de fato amplamente difundido por todo o Brasil, a candidata Dilma Rousseff (PT) passou a cair vertiginosamente nas pesquisas eleitorais. Frustrou-se a sua esperança de vencer em primeiro turno.

No segundo turno, ela tomou as seguintes providências:

a) apresentou-se como “católica”, defensora da vida, “pessoalmente (sic) contra o aborto” e até mesmo devota de Nossa Senhora Aparecida (ao lado de seu cabo eleitoral Gabriel Chalita);

b) requereu ao Tribunal Superior Eleitoral que apreendesse dois milhões de exemplares do temido documento, que acabavam de ser impressos em uma gráfica de São Paulo, a pedido do bispo de Guarulhos (SP) Dom Luiz Gonzaga Bergonzini. Lamentavelmente o Ministro Henrique Dias (TSE) concedeu uma liminar arbitrária determinando a apreensão de todo aquele material informativo. A ilegalidade da liminar foi reconhecida pelo Ministério Público Eleitoral em 30/10/2010, mas até hoje – que morosidade! – o TSE ainda não deu uma decisão definitiva de mérito.

c) divulgou em 15/10/2010 uma carta intitulada “Mensagem da Dilma”, na qual, contrariando sua posição de 2007, defendeu a “manutenção da legislação atual sobre o assunto” [aborto], e prometeu não promover “nenhuma iniciativa que afronte a família”.

Importa salientar que esse compromisso da candidata é absolutamente desprovido de valor. Ele pode ser descumprido sem qualquer sanção. O compromisso válido é o que ela assinou ao candidatar-se pelo PT, por força do que diz o Estatuto de seu Partido:

Art. 128. São pré-requisitos para ser candidato do Partido:

[...]

c) assinar e registrar em Cartório o “Compromisso Partidário do Candidato Petista”, de acordo com modelo aprovado pela instância nacional do Partido, até a realização da Convenção Oficial do Partido.

§ 1º A assinatura do “Compromisso Partidário do Candidato Petista” indicará que o candidato está previamente de acordo com as normas e resoluções do Partido, em relação tanto à campanha como ao exercício do mandato.

Note-se que Dilma Rousseff, como todo candidato pelo PT, assinou e registrou em cartório o “Compromisso Partidário do Candidato Petista” acima mencionado. Na ocasião, ela se comprometeu a acatar as “normas e resoluções do Partido”. E esse compromisso vale, não apenas para a campanha eleitoral, mas também para o “exercício do mandato”. Uma vez eleita presidente da República, ela está obrigada a exercer seu mandato de acordo com as resoluções do PT.

Entre as resoluções que ela se comprometeu a seguir está uma denominada “Por um Brasil de mulheres e homens livres e iguais” aprovada no 3º Congresso do PT (agosto/setembro 2007), que inclui a “defesa da autodeterminação das mulheres, da descriminalização do aborto e regulamentação do atendimento a todos os casos no serviço público.

Esse sim foi um compromisso válido. Se, por mera hipótese, Dilma se recusasse a cumprir essa resolução partidária, seria punida pelo Partido, como prescreve o Estatuto no parágrafo seguinte:

Art. 128 § 2º Quando houver comprovado descumprimento de qualquer uma das cláusulas do “Compromisso Partidário do Candidato Petista”, assegurado o pleno direito de defesa à parte acusada, o candidato será passível de punição, que poderá ir da simples advertência até o desligamento do Partido com renúncia obrigatória ao mandato.

Dilma, portanto, como todo político eleito pelo PT, não tem escolha: ela está obrigada a usar seu mandato para defender o aborto.

Segundo uma frase atribuída a François, Duque de La Rochefoucauld (1623-1680), “a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”. Ao disfarçar-se de defensora da vida e da família, Dilma prestou homenagem à causa que ela detesta. Sua simulação foi o reconhecimento de que a vida e a família são valores importantes, ao menos para fins eleitorais.

Tudo isso demonstra como é eficiente divulgar aos eleitores o nome de partidos incompatíveis com a doutrina cristã. Desta vez os Bispos se restringiram ao PT e sua candidata à presidência. Nada impede que, em outras eleições, sejam incluídos nomes de outros partidos e candidatos comprometidos com o aborto.


Segunda lição: a ineficácia e o perigo dos termos de compromisso

Houve líderes pró-vida que, com a melhor das intenções, passaram a convocar os candidatos para que assinassem um “termo de compromisso” em defesa da vida. A lista dos subscritores desse termo foi divulgada na Internet como a relação dos que estavam aptos a receber os votos dos cristãos.

A eficácia dessa iniciativa é pequena, pois a assinatura do termo não cria qualquer vínculo jurídico nem expõe o signatário a qualquer tipo de sanção. O mais grave, porém, é que o tiro pode sair pela culatra, pois não se põe nenhum pré-requisito para que um candidato ponha seu nome no documento. Nestas eleições, vimos de tudo, inclusive candidatos do PT – logo, comprometidos oficialmente com o aborto! – entre os que assinaram o termo de compromisso pela vida. Isso certamente contribuiu para gerar confusão entre os eleitores.

Antes de pedir a um candidato que faça um compromisso com os eleitores, é preciso ver que compromissos ele já fez com o próprio partido (como o PT, o PV e outros, que exigem compromisso com o aborto). É preciso em seguida ver como eles votaram, como parlamentares, as propostas legislativas relativas à vida e à família. As promessas eleitorais devem ocupar o último lugar.


Terceira lição: não exigir o candidato ideal

Houve eleitores que, na falta de candidatos cem por cento pró-vida, optaram por votar nulo ou em branco. Essa atitude lamentável serviu apenas para facilitar a vitória de Dilma Rousseff. Dom Raymond L. Burke, prefeito do Supremo Tribunal da Signatura Apostólica, esclareceu em 20/10/2010 como deve ser o comportamento do eleitor cristão:

Não se pode jamais votar em alguém que favoreça absolutamente o direito de uma mulher de destruir uma vida humana em seu seio ou de procurar um aborto.

Em algumas circunstâncias em que não exista nenhum candidato que se proponha a eliminar todo e qualquer aborto, pode-se escolher o candidato que mais limite esse grave mal em nosso país; mas jamais seria justificável votar num candidato que não só não quer limitar o aborto mas entende que ele deva estar ao alcance de todos.

Infelizmente, no segundo turno, estando entre José Serra (que admite o aborto em caso de estupro) e Dilma Rousseff (que deseja sua completa descriminalização), os eleitores nem sempre souberam optar pela restrição do dano. Essa lição não pode ser esquecida nas próximas eleições.

Anápolis, 12 de dezembro de 2010.

Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz


Relacionados:

Nenhum comentário:

Postar um comentário