* A Ideologia do Gênero e sua linguagem, perigo escondido atrás das palavras.
julho 20th, 2011Pe. Luiz Carlos Lodi da Cruz
Está para ser lançada no Brasil no fim deste ano a versão portuguesa do livro do advogado argentino Jorge Scala “El género como herramienta de poder” sobre a perigosa e destrutiva “ideologia de gênero”.
Em nossa língua poucos são os que compreendem a origem, o significado e o perigo de tal ideologia. Não tivemos ainda, por parte do episcopado brasileiro, um documento semelhante ao produzido pela Conferência Episcopal Peruana “La ideología de género: sus peligros y alcances” (1998)[1] . Ao contrário, não são poucas as vezes em que membros da hierarquia católica em nosso país fazem uso – inadvertidamente, é claro – de termos emprestados àquela ideologia.
Falar de desigualdade de gênero, opor-se à homofobia, não aceitar discriminações contra os homossexuais, dividir as pessoas em homossexuais e heterossexuais, tudo isso se encontra em escritos de zelosos pastores de almas, inocentes úteis nas mãos de uma doutrina tão perniciosa.
O autor, em sua monumental obra “IPPF: a multinacional da morte”, que tive a honra de traduzir para o português[2] , já fazia questão de advertir os leitores contra o emprego de termos cunhados pela cultura da morte. Entre eles estava a expressão “planejamento familiar”[3] , sistematicamente evitada pelo Santo Padre e pela Cúria Romana, mas amplamente usada por sacerdotes, bispos e até por Conferências Episcopais. Em vez de “planejamento familiar” (que inclui aborto, esterilização e anticoncepção), os católicos devem falar em paternidade responsável, um termo caro ao Magistério da Igreja, que significa não só o espaçamento dos filhos (por razões graves e com respeito à lei moral), mas também a abertura à bênção de uma família numerosa[4] .
Em seu livro sobre “gênero” a ser lançado no Brasil, Jorge Scala alerta mais uma vez que o jogo de palavras dessa ideologia não é inocente. Segundo a “ideologia de gênero”, não existe um homem natural nem uma mulher natural. O ser humano nasce sexualmente neutro. A sociedade é que constrói os papéis masculinos ou femininos. “Gêneros” são papéis socialmente construídos. Como não existe uma masculinidade e feminilidade naturais, cada um pode “desconstruir” o papel que lhe foi imposto por convenção social. Surge assim a liberdade de “casar-se” com uma pessoa do mesmo sexo e a exigência de o Estado reconhecer essa forma de “família”. Se não existe uma vocação da mulher à maternidade, pode-se falar no direito a “interromper a gravidez”, colocado entre os “direitos sexuais e reprodutivos”. Homossexualismo, transexualismo, travestismo, adoção de crianças por duplas homossexuais, prostituição, pedofilia e aborto são algumas das tristes consequências dessa ideologia.
Além da palavra “gênero”, Jorge Scala faz uma lista de locuções habilmente usadas para manipular a linguagem: opção sexual, igualdade sexual, direitos sexuais e reprodutivos, saúde sexual e reprodutiva, igualdade e desigualdade de gênero, “empoderamento” da mulher, “patriarcado”, “sexismo”, cidadania, “direito ao aborto”, gravidez não desejada, “tipos” de família, “androcentrismo”, “casamento homossexual”, sexualidade polifórmica, “parentalidade”, “heterossexualidade obrigatória” e “homofobia”. “Como se pode ver – prossegue o autor – trata-se de uma nova linguagem, de características esotéricas, cuja função é assegurar a confusão”.
É digno de nota como ele adverte-nos sobre o perigo de usar a palavra “heterossexual”:
Devo confessar ao leitor que não sou “heterossexual”. Na realidade os “heterossexuais” não existem. Explico-me: sou apenas homem, sem nenhum acréscimo porque qualquer um deles é desnecessário. Todos nós, seres humanos, podemos ser apenas homens ou mulheres, em relação à sexualidade. Não existe nenhum “terceiro sexo”. É verdade que existem pessoas com fragilidades sexuais de diversos tipos. Isto é verdade, existem algumas de origem biológica, como o hermafroditismo; e outras de origem psíquica, como a homossexualidade, o lesbianismo, o travestismo etc.. Portanto, quem utiliza o termo “heterossexual” para contrapô-lo a “homossexual”, está afirmando, implicitamente, que ambas as categorias são igualmente válidas e opcionais; por isso, alguns escolheriam ser “heterossexuais” e outros “homossexuais”. A realidade é o contrário: a normalidade física e psíquica em matéria de sexualidade tem apenas duas versões: mulher e homem. Então, a “heterossexualidade” não existe. Do mesmo modo que ninguém pensa em chamar uma pessoa de “não leproso” ou “não diabético”, por contraposição a um “leproso” ou a um “diabético”. É tão absurdo quanto incorreto falar de “heterossexuais”. Esse vocábulo não é inocente, ainda quando a maioria das pessoas utiliza o termo sem perceber que está sendo manipulada semanticamente.
É preocupante ver como no Brasil os cristãos têm-se deixado cair nas armadilhas da linguagem de “gênero”. Diz-se, sem mais, que a Igreja é contrária à “discriminação” aos homossexuais. Ora, isso não é exato. O Catecismo da Igreja Católica teve o cuidado de distinguir: “evitar-se-á para com eles todo sinal de discriminação injusta” (n.º 2358). O texto supõe, portanto, que a Igreja admite discriminações justas para com os homossexuais. E de fato admite. Uma delas é a proibição de receberem a Sagrada Comunhão, enquanto não abandonarem seu pecado (o que vale também para qualquer outro pecado grave). Outra é a impossibilidade de serem admitidos em seminários e casas religiosas.
De modo semelhante, um cristão não deve dizer que se opõe à “homofobia”, pois este vocábulo pejorativo foi criado para designar as discriminações justas[5] .
Diferenças naturais entre os sexos
Para combater a ideologia de gênero, Jorge Scala mostra as diferenças naturais que existem entre o homem e a mulher, que são “dois modos diferentes de encarnar a humanidade”.
A mulher tem uma capacidade inata de dar atenção, o que a torna mais predisposta a dar aulas a crianças pequenas. Esse dom inato permite que várias mulheres falem simultaneamente, prestem atenção e respondam a cada uma das interlocutoras. Um homem submetido a essa “pressão” em pouco tempo começa com enxaqueca.
O homem tem maior capacidade de concentração, o que torna para ele muitas vezes mais fácil a demonstração de um difícil teorema matemático.
Com relação à percepção visual, a mulher capta os detalhes; o homem tem uma visão de conjunto. A visão estratégica, a capacidade de síntese, o amor a toda a humanidade – desconsiderando em parte o próximo -, a paixão pela coisa pública são atitudes varonis. Ao contrário, a percepção sensível e amorosa de um dos detalhes, o interesse autêntico pelo próximo e o tornar acolhedores os espaços físicos que ocupa são modos femininos de se relacionar com o ambiente.
Diante de um fato externo – qualquer que seja ele – a mulher reage de forma integrada, isto é, capta-o simultaneamente com sua inteligência, sua vontade e seus afetos. O homem reage primeiramente de forma racional, colocando os sentimentos e a vontade como que entre parênteses. Isso lhe possibilita analisar com frieza fatos comoventes, sem que signifique insensibilidade.
O que é ser homem e o que é ser mulher?
Identificar o ser mulher com a maternidade é algo execrado pelas feministas de gênero. Em 31/01/2000, o Comitê sobre e Eliminação da Discriminação contra a Mulher criticou a Bielo-Rússia (ou Belarus) por ter reintroduzido símbolos como o “Dia das Mães” e o “Prêmio das Mães”, o que foi visto como “um encorajamento aos papéis tradicionais das mulheres”. O mesmo Comitê propôs a “introdução da educação de direitos humanos e de gênero” como remédio para essa “estereotipação”[6] .
No entanto, Jorge Scala afirma que o que define cada um dos sexos é justamente sua vocação procriadora:
Em definitivo, ser mulher é a maternidade e ser homem é a paternidade. Ora, isto deve ser entendido em um sentido antropológico. É, portanto, independente do fato de terem sido mãe ou pai biológicos.
E o que é a maternidade ou – o que dá no mesmo – o que é a mulher? A maternidade é a qualidade inata pela qual as mulheres sempre acolhem outros seres humanos – especialmente os entes queridos. E isto implica duas coisas: 1º) que elas estão sempre presentes – transcendendo até a distância física da separação; e 2º) que essa presença significa incondicionalidade absoluta em relação ao outro – em especial ao filho.
[...]
E o que é a paternidade ou – o que é equivalente – o que é o homem? A paternidade é a missão masculina que consiste em encarnar a autoridade. Para isso deve dar – sempre e sem exceções – o bom exemplo, fazendo o que deve ser feito em cada situação, ainda que isso signifique, muitas vezes, sofrer um prejuízo ou padecer uma injustiça.
Notas:
[1] CONFERENCIA EPISCOPAL PERUANA. Comisión Episcopal de Apostolado Laical. Comisión ad–hoc de la mujer. La ideología de género: sus peligros y alcances. Lima, abr. 1998. Disponível em http://www.vidahumana.org/vidafam/iglesia/genero.html .
* Vaticano na ONU: “Relacionamentos heterossexuais e homossexuais não são equivalentes do ponto de vista da natureza e moral”
julho 19th, 2011Vatican Insider
A Santa Sé reitera o “não” a discriminações e violências contra homossexuais, mas condena a tentativa de impor a ideia segundo a qual qualquer tipo de relação seria equivalente do ponto de vista da natureza e da moral.
O Vaticano protesta contra o “mapa” da ONU sobre os direitos dos gays, pois não permitiria nenhuma distinção moral, política ou jurídica em relação ao casamento, à adoção ou à inseminação artificial.
A recente resolução das Nações Unidas sobre a orientação sexual e a identidade de gênero começou a fazer parte de um documento-manifesto que poderia limitar a liberdade da Igreja. Na prática, não seria considerado mais admissível ter uma opinião moral ou religiosa sobre a homossexualidade.
O Vaticano, portanto, adverte contra o pensamento único, imposto em nome da erradicação da homofobia e da transfobia. As categorias de orientação sexual e de identidade de gênero não são nem reconhecidas, nem univocamente definidas no direito internacional e, portanto, são suscetíveis a serem interpretadas e definidas segundo as intenções daqueles a quem elas se referem.
Segundo o representante da Santa Sé no Conselho dos Direitos Humanos de Genebra, a agenda das Nações Unidas põe em perigo a liberdade religiosa da Igreja.
“O objetivo é incluir os direitos dos gays na agenda global dos direitos humanos“, adverte o arcebispo Silvano Maria Tomasi, observador permanente da Santa Sé junto ao escritório da ONU em Genebra. De acordo com a Santa Sé, uma das possíveis distorções é que, se um Estado ou uma comunidade religiosa se recusassem a celebrar o matrimônio para os casais do mesmo sexo ou a reconhecer as suas adoções de crianças, poderiam estar violando os direitos dos gays inseridos na agenda das Nações Unidas. E, em casos extremos, os ministros religiosos poderiam até mesmo receber uma liminar para celebrar os casamentos gays.
A contribuição da Igreja para reflexão sobre os direitos humanos nunca se separou da perspectiva da fé no Deus criador. Para a Igreja Católica, tratando-se de direitos que têm a ver com a vida e com os comportamentos das pessoas, das comunidades e dos povos, o discernimento prevê que se questione todas as vezes se as problemáticas que se quer reconhecer como novos direitos promovem um verdadeiro bem para todos e que relação têm com os outros direitos e com as responsabilidades de cada um.
O que está sendo ameaçado pelo “mapa” sobre os direitos dos gays, portanto, é a liberdade religiosa . De um lado, a Santa Sé se contrapõe a uma ditadura da razão positivista que exclui Deus da vida da comunidade e dos ordenamentos públicos, privando assim o homem de seus critérios específicos de medida; de outro, acolhe as verdadeiras conquistas do Iluminismo, os direitos humanos e especialmente a liberdade da fé e do seu exercício, reconhecendo neles elementos essenciais também para a autenticidade da religião.
O impasse entre o Vaticano e a ONU se insere na discussão sobre os direitos dos LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros), entre os quais também estão contemplados o matrimônio, a adoção e a inseminação artificial.
A Santa Sé compartilha o legítimo fim de evitar discriminações injustificadas e de proteger as pessoas LGBT contra violências, mas condena a tentativa de forçar a opinião e as consciências, impondo uma ideia segundo a qual todo tipo de relacionamento (heterossexual, homossexual, bissexual ou transgênero) seria equivalente do ponto de vista da natureza e da moral. Isso, de acordo com a Santa Sé, viola diversos direitos fundamentais, ao mesmo tempo em que enfraquece as liberdades de opinião, de expressão e de religião. O que está em risco, portanto, é a liberdade da Igreja e dos crentes.
Além disso, a família e as crianças não seriam mais reconhecidos como realidades naturais em si mesmas, mas como objeto de desejo subjetivo em virtude da existência de um direito dos gays a se casar, a adotar e a estabelecer uma “família”, como se as realidades naturais não existissem. A Santa Sé está preocupada com a negação da diferenciação entre as realidades de casais heterossexuais e de relações entre pessoas LGBT, além da neutralização moral da sexualidade.
A polêmica entre Roma e Genebra se baseia na oposta avaliação de um pressuposto: ou seja, se a sexualidade é externa ou não à esfera da ação moral. Para a moral católica, a sexualidade humana, como toda atividade voluntária, possui uma dimensão moral: é uma atividade exercida por uma vontade individual, para uma finalidade. Não é uma “identidade”. Em suma, depende do agir e não do ser, apesar do quanto as tendências homossexuais possam estar enraizadas na personalidade.
Negar a dimensão moral da sexualidade equivale a negar a liberdade da pessoa nesse âmbito e leva, em última instância, a uma violação da sua dignidade ontológica. A Santa Sé teme que o reconhecimento de uma plena igualdade jurídica para as pessoas com orientação homossexual possa se prestar à reivindicação do matrimônio entre dois.
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